Diretor de Programas da SIC esteve com Pedro Morais Leitão (Media Capital), Carlos Rodrigues (Medialivre) e Nicolau Santos (RTP) no Portugal Football Summit a debater o futuro da televisão
Para onde vai a televisão e como se pode reinventar? Trata-se de uma conversa que pode durar horas, especialmente quando se juntam figuras relevantes do panorama televisivo nacional. No fim de contas, a essência fala mais alto, como defende Daniel Oliveira, Diretor de Programas da SIC.
“A proximidade parece-me o maior desafio, no sentido de que temos de estar próximos de quem nos vê. Temos o desafio de desdobrarmos os conteúdos que produzimos, hoje em dia, para que cheguem a cada vez mais pessoas. É essencial quando pensamos nos players internacionais e como estão a ir para esse território. Somos tão mais relevantes se produzirmos conteúdos de qualidade. Se existirem, vão sempre ser consumidos de alguma forma. O que vemos não é um decréscimo do consumo de televisão. Nunca se consumiu tanto vídeo à escala mundial na história da humanidade como agora. Há é uma fragmentação. Isso traz um desafio estimulante. Todos temos de nos expandir de alguma forma e o centro já não é o canal, o aparelho. O conteúdo é o rei de tudo. Se continuarmos a produzir conteúdos relevantes, com identidade nacional e proximidade das pessoas, acho em que em 2030 estaremos bem”, sublinhou.
Nessa linha, Daniel Oliveira deixa um apelo. “Todos nós esbarramos no facto de os clubes fecharem os seus protagonistas numa trincheira e não os libertam para terem uma amplificação junto do público. O que cativa mais um jovem que se encanta pelo futebol? Uma discussão sobre futebol ou vermos um jogador a ir às suas origens? Há potencial, há milhões a todos os níveis de desperdício que estamos a gerar, porque as televisões não têm acesso aos protagonistas. Os clubes não estão a aproveitar esse potencial e as televisões também não porque não têm acesso aos mesmos. Há um caminho que tem de ser trilhado, se calhar também culturalmente temos de evoluir alguma coisa, para os protagonistas terem o espaço que merecem. Há um potencial comercial que está a ser desperdiçado”, comentou.
Experiências e novos desafios
Pedro Morais Leitão aproveitou a oportunidade para explicar como tem corrido a transmissão dos jogos do Moreirense nas plataformas da Mediacapital, como exemplo de outro tema que esteve em debate: “A pergunta que se faz é se se pode fazer dinheiro a partir da transmissão gratuita do futebol. Financiá-lo com base em publicidade. O Moreirense é alguém em que vamos investir ao longo dos próximos três anos e acreditamos que vamos ter retorno. As audiências dos jogos do Moreirense até agora, quando comparadas com as da Sport TV no ano passado, multiplicam por 10. Se conseguimos a cada jogo pagar o que estamos a pagar de direitos? Não. Se acreditamos que o vamos fazer no futuro? Sim.”
Mas o futuro traz novos panoramas. E Morais Leitão não tem dúvidas quanto a um dos caminhos a seguir em termos concretos. “O futuro da televisão já hoje não é a televisão. O primeiro iPhone foi lançado em 2007 e desde aí o telemóvel mudou o panorama da comunicação social a nível mundial. Os milhões de euros que se perderam de publicidade na televisão migraram essencialmente para o telemóvel. As pessoas passam mais tempo no telemóvel do que na televisão. Vejo que em 2030 isso levará a que tudo o que esteja relacionado com o telemóvel seja muito relevante. Acredito que vamos estar muito focados no conteúdo e em animar o conteúdo. Em relação ao futebol, o conteúdo está no centro, mas é o que podemos acrescentar. O que gostávamos de fazer mais no Moreirense é ter mais animação, levar lá as nossas estrelas, dar mais visibilidade aos protagonistas, entrar no balneário, mostrar a experiência de vida do clube em si”, sustentou.
Nicolau Santos, presidente do Conselho de Administração da RTP, usa a sua experiência para explicar como o fenómeno televisivo está a mudar. “A rentabilidade deste tipo de produtos é muito complicada. Com as receitas publicitárias, nunca se consegue ficar no breakeven. Há outro perigo que ameaça a transmissão de jogos de futebol e tem a ver com a entrada em cena de operadores internacionais, que até agora não faziam isto. Netflix, Amazon, que vão disputar um terreno que até agora era o nosso. Quando hoje em dia aparecem representantes da FIFA a pedir valores incomportáveis para a transmissão do próximo Campeonato do Mundo, talvez fosse bom fazerem contas e olharem para o mercado publicitário em Portugal para os três operadores em sinal aberto. Em 2006, tinham um bolo publicitário de 361 milhões de euros. Em 2024, tiveram de 201 milhões, menos 55%. É para demonstrar que não temos capacidade hoje em dia de irmos sozinhos tentar ficar com os direitos de alguma transmissão de uma competição internacional de seleções ou clubes”, explicou.
Lidar com a inteligência artificial
Carlos Rodrigues, Diretor-Geral da Medialivre, destacou a importância inegociável do rigor jornalístico, mas também olhou para o que será preciso saber dominar. É aqui que entra a inteligência artificial e todo um mundo novo que surge quase a cada dia. “Entre hoje e 2030, vejo o espectro televisivo a ser o mesmo que é hoje. Penso que todos os intervenientes têm desafios muito intensos e em 2030 alguns deverão estar resolvidos. Simultaneamente, há o grande desafio da Inteligência Artificial. O fenómeno da transmissão televisiva e todo o fenómeno audiovisual está numa crise existencial por causa da IA. E nem todos nós estamos preparados ainda para enfrentar esse desafio. É seguramente o grande desafio da próxima década”, resumiu.